sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Série Plantadores de Florestas - Cap. III - O sequestrador de carbono

No comando da consultoria ambiental Companhia Brasileira de Florestas Tropicais (CBFT), Rodolpho Schmidt promove ações para sequestro de carbono


Rodolpho Schmidt em um de seus reflorestamentos, na região de Campinas.

Aos 16 anos, Rodolpho Schmidt deu uma entrevista para a televisão, na qual declarava sua intenção de seguir os passos do avô - Wolfgang Carl Adolph Schmidt - como plantador de florestas. Alemão de Berlim, seu Schmidt (como o avô era mais conhecido), morava desde os anos 1940, na fazenda Santa Mônica, na região de Joaquim Egídio, Campinas, interior de São Paulo. Há muito havia deixado de "colecionar madeiras para colecionar árvores", como ele dizia. E por sua defesa incondicional do plantio de matas acabara de receber o Prêmio Global 500, junto com sua esposa, Anésia do Amaral Schmidt. Era 1992 e o Brasil sediava a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, a Rio92, durante a qual o casal recebeu a homenagem internacional.

Quando veio para o Brasil, ainda jovem, Wolfgang Schmidt era madeireiro. Encantou-se com a variedade das madeiras nativas e cortou muitas árvores para ganhar a vida. Mas logo percebeu a fragilidade da exploração sem reposição e passou a fazer experimentos de plantio em sua fazenda.

Constituiu um arboreto com mais de 100 espécies madeireiras e, na base de tentativas e observação direta, aprendeu a enxergar o valor da biodiversidade nos reflorestamentos, fossem eles para fins comerciais ou de conservação. Como tudo isso aconteceu numa época em que o movimento ambientalista nem havia nascido, não faltaram más línguas para chamar seu Schmidt de "alemão maluco".

Em sua mesa de madeira reciclada, Rodolpho Schmidt assiste à entrevista que deu aos 16 anos para a TV quando seu avô, Wolfgang Schmidt (no computador à esquerda) ganhou o Prêmio Global 500 da ONU.
Desde pequeno, Rodolpho acompanhava o avô pelo arboreto, ouvindo suas lições apaixonadas junto com a prima Helena. Ele acabou virando engenheiro florestal e ela fez Biologia. Os outros oito netos seguiram caminhos diferentes. Assim, em 2005, quando Wolfgang Schmidt faleceu, aos 100 anos, era natural que Rodolpho herdasse a porção da fazenda onde fica o arboreto, assumindo também a herança imaterial de plantador de florestas.

As árvores do avô hoje são matrizes de onde Rodolpho tira sementes para os seus reflorestamentos, de reconstituição de Áreas de Preservação Permanente (APPs), Reserva Legal (RL) e, principalmente, para sequestro de carbono (ou seja, plantar árvores para compensar emissões de gases de carbono resultantes da queima de combustíveis e do consumo de energia). As lições aprendidas na infância transparecem na forma de organizar tais plantios e, sobretudo, na sobriedade germânica da prestação de contas de sua empresa, a Companhia Brasileira de Florestas Tropicais ou CBFT.

"Em lugar de primeiro captar recursos de empresas que querem fazer a compensação de carbono e depois procurar um local para plantar, fazemos o inverso. Primeiro procuramos um local, uma fazenda onde é preciso recompor as APPs ou RL ou áreas onde haja a intenção de fazer reflorestamento para exploração comercial. Avaliamos o potencial do local em termos de sequestro de carbono, dividimos em cotas e só então passamos a vender estas cotas", resume Rodolpho, hoje com 36 anos.

Cada árvore plantada recebe um código e é periodicamente fotografada. A empresa ou o organizador de evento que faz a compensação de carbono - ou qualquer outra pessoa interessada - pode acompanhar o crescimento de cada muda via internet. Isso evita duplicação - vender o mesmo plantio para empresas diferentes - e também facilita o cálculo do carbono efetivamente fixado (quer dizer, transformado na madeira do tronco e dos galhos das árvores).


Madeira resultante de podas urbanas ao lado das árvores plantadas por Wolfgang Schmidt, avô de Rodolpho.

Rodolpho agora transforma a madeira resultante de podas urbanas em móveis, contribuindo para a fixação de carbono.

O conceito de reflorestamento usado por Rodolpho também revela a influência do avô. "O reflorestamento é feito com o duplo objetivo de recuperação natural e obtenção de madeira para exploração comercial", explica. "Plantamos uma linha de eucaliptos e uma linha de árvores nativas, de modo intercalado. Os eucaliptos serão aproveitados para lenha ou madeira nos anos iniciais, rendendo até 3 cortes. Eles permitem ao dono da propriedade obter alguma renda enquanto a mata cresce, e fazem sombra para as mudas de nativas, que não crescem a pleno sol. A sombra dos eucaliptos ainda força as árvores nativas a crescerem retas, de forma apropriada para o futuro uso comercial da madeira". Vale notar que o carbono absorvido durante o crescimento de uma árvore se mantém fixado se sua madeira é aproveitada para fazer móveis. O carbono só volta a ser liberado se a árvore apodrecer ou se for queimada.

Outra grande diferença nos plantios é o tratamento dado às impopulares "ervas daninhas". Em lugar de passar a máquina por cima, lutando para eliminá-las, Rodolpho as tem como aliadas. "O alecrim-do-campo e diversas outras plantas consideradas daninhas em lavouras são as pioneiras da reconstituição da mata. Elas é que vão ajudar a formar o solo florestal, possibilitando a sobrevivência das árvores mais nobres e, depois, quando a área já estiver sombreada pelas novas árvores, elas desaparecem naturalmente", diz o engenheiro florestal. "A natureza tende à floresta: basta controlar o pasto ou deixar de plantar outra coisa e a mata rebrota, as aves semeiam, os animais replantam. Basta deixar e não atrapalhar. O mais importante é compreender a natureza e ter paciência".

À parte do plantio de florestas, Rodolpho também faz laudos para prefeituras e para órgãos ambientais, orientando o corte de árvores urbanas em situação de risco: apodrecidas, com cupins, ameaçando cair sobre edificações, danificadas após temporais ou enchentes etc. "Sempre fiquei incomodado com o fato de muitas dessas árvores serem transformadas em lenha ou serem simplesmente queimadas. Após muita negociação consegui trazer parte dessas árvores para a fazenda, para reciclar, construindo móveis". Mesmo os galhos de árvores resultantes da poda urbana, feita para proteger a fiação elétrica, agora se transformam em cadeiras, mesas e objetos de decoração, com apoio da esposa de Rodolpho, a arquiteta Maira Del Nero.

"O uso da madeira urbana demonstra respeito à história das árvores, pois seu produto permanece vivo na forma de peças certificadas. Além disso, ao usar produtos madeireiros certificados, contribuímos para evitar emissões de carbono para a atmosfera", acrescenta, Rodolpho. Alguns desses móveis do Projeto Madeira Urbana - fruto da parceria com o designer Paulo Werneck - venceram na categoria Produto do Prêmio Planeta Casa, em 2010. O prêmio é uma iniciativa da revista Casa Cláudia, realizado em parceria com o movimento Planeta Sustentável, ambos da Editora Abril.

Rodolpho Schmidt também tem um quê de poeta, músico e blogueiro. Compartilha sua produção artística com o público em http://rodolphoschmidt.wordpress.com, misturando conhecimento, capacidade de observação e profissionalismo com a herança de paixão pelas árvores do avô Wolfgang Schmidt. Vale a pena passar por lá para conhecer um pouco melhor esse sequestrador de carbono.
Fonte: National Geografic BR

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