Empresas reclamam da ausência de regulação ambiental; movimentos sociais e indígenas são contrários ao REDD.
Empresas reclamam da ausência de regulação ambiental; movimentos sociais e indígenas são contrários ao REDD. Foto: Thiago Foresti |
É uma sigla complicada, que pouca gente conhece, mas o REDD (ou Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação) é tido como um dos principais programas de incentivo econômico para a redução do desmatamento no mundo pelas Nações Unidas. A proposta do REDD é incluir na contabilidade das emissões de gases de efeito estufa as emissões evitadas com a redução do desmatamento e a degradação florestal. Ou seja: dar valor real para a conservação através de projetos e programas que comprovem na prática a sua eficácia na manutenção dos estoques de carbono.
O governo de Mato Grosso, estado com um histórico crescimento gigantesco do agronegócio e bastante criticado por ambientalistas, está de olho nesse “incentivo”. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), o estado alcançou uma redução de 1,2 milhões de toneladas de Co2 no período de 2006 a 2011. “É um número impressionante que fica atrás apenas do que foi apresentado pela Alemanha, país com uma arrojada política ambiental”, diz Daniel Nepstad, pesquisador do IPAM.
Para Nesptad, vários os fatores forçaram essa redução, tais como a moratória da soja e da carne, o cadastramento ambiental rural (CAR) e as chamadas mesas redondas de negociação da soja. “Está na hora do estado obter reconhecimento por essas reduções e a consolidação de uma política de REDD é uma excelente oportunidade”, afirma.
Em agosto, o governo de Mato Grosso enviou à Assembleia Legislativa do estado uma proposta de sistema estadual de REDD que deve ser votada ainda este ano. Para debater o assunto, foi realizado em agosto o seminário REDD+ em Mato Grosso: rumo à implementação. O evento contou com a presença do diretor do Programa Internacional da Iniciativa para Clima e Florestas do governo da Noruega, Per Fredrik Ilsaas Pharo, e o diretor da Permian Global, Jason Patrick.
Com a aprovação do sistema estadual, Mato Grosso se junta ao Acre e a outros 22 estados subnacionais de países como Estados Unidos, Indonésia, Nigéria, México e Peru que já têm marcos legais próprios para a implementação de projetos de REDD. O objetivo agora é integrar essas políticas e fomentar a regulação de sistemas nacionais e internacionais. “O que a gente busca é dar um pontapé inicial para o estabelecimento de marcos legais. São várias pecinhas dentro desse grande mecanismo que ainda serão aprimoradas com o tempo, mas precisamos desse marco legal para começar a trabalhar”, diz Andréa Azevedo, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM).
O projeto de lei de Mato Grosso prevê a criação de um amplo inventário de emissões e a definição de uma linha de base para medir níveis de desmatamento. São passos importantes para consolidação de uma política estadual, mas, segundo Bruno Simionato, analista de carbono do ICV, ainda existe muita incerteza em relação à contabilidade dos estoques de carbono florestais. “Fizemos um mapeamento de carbono só para o município de Cotriguaçu [950 km de Cuiabá] e a variação foi muito grande. Notamos que essa contabilidade depende de muitos fatores como tipologia florestal, altitude e solo. É um terreno incerto”, diz.
Além das dificuldades de medição, os programas nacionais e estaduais ainda não estão preparados para reivindicarem créditos de carbono no âmbito da Convenção de Clima da ONU e só sobrevivem através de financiamento oriundos de fundos, como o Fundo Amazônia, e outros de países desenvolvidos como a Noruega. Além disso, a falta de regulamentação por parte dos estados e do governo federal torna o terreno do REDD muito mais difícil de ser percorrido para empresas com interesse em investir na gestão florestal.
Empresas sofrem com a falta de regulação adequada
Plinio Ribeiro, diretor da Biofílica Investimentos Ambientais, diz que a indefinição nos marcos regulatórios é o pior cenário para uma empresa. “Quando criamos a Biofílica, há quatro anos, imaginávamos que os acordos numa hora dessas já estariam mais robustos e implementados, mas não estão”. Ribeiro diz que o que não falta é a capacidade de regular a oferta ou de saber como fazer projetos bem feitos: “O mercado é muito rápido em eliminar os exemplos ruins e deixar os bons. O que falta nesse momento é um compromisso maior dos países e estados para criar restrições e oferecer mecanismos de compensação”.
“Infelizmente hoje, quando falamos em gestão florestal dentro setor privado acabamos caindo na madeira ou no carbono. Quando concebemos nossa empresa pensamos em três premissas básicas. A primeira é a de que o Brasil tem o maior território de floresta tropical do mundo, a segunda é que esse território não é bem gerido, isso quando é gerido, e a terceira é que existe uma relação clara entre floresta e clima e floresta e biodiversidade. Então pensamos que talvez existisse um modelo de negócio que pudesse se propor a gerir esses territórios”, diz Ribeiro.
Movimentos Sociais e indígenas não vêm o REDD com bons olhos
Outra forte resistência encontrada por quem trabalha com o REDD são os movimentos sociais. “Essa tal economia verde é só mais uma tentativa de curar um doente com o mesmo veneno. O que eles querem fazer é trocar o rótulo, ou seja, o que se prega como solução para a crise é justamente a causa da crise”, diz Herman Hudson Oliveira, diretor do Fórum Mato-Grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad).
Indígenas também demonstram preocupação com o mecanismo. Estevão Bororo, da aldeia Córrego Grande, questiona se os indígenas não vão perder autonomia sobre seus territórios através de contratos de REDD. “Sabemos de histórias de contratos com terras indígenas que prometem muito dinheiro, mas que tiram do índio a possibilidade de autonomia sobre seu território”, diz Estevão.
“É justamente isso que a gente não quer. Essa falta de regulação do mercado abre uma grande brecha para os chamados carbon cowboys, que são aquelas empresas que ninguém sabe de onde vêm, falam com os indígenas, prometem milhões e chegam com contratos malucos dizendo que os índios não podem mexer na terra deles.”, diz Andréa Azevedo pesquisadora do Ipam.
A pesquisadora acredita que o REDD pode ser uma forma de mudar os rumos da economia atual. “O sistema jurisdicional evita uma abordagem negativa de tratar o REDD como um grande balcão de projetos e traz o mecanismo para o âmbito das ações de políticas públicas numa escala muito maior”.
Fonte: Carta Capital
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